Milícia impõe toque de recolher a escola pública no Rio, e alunos ficam sem aula

Escola, em Santa Cruz, está liberando alunos mais cedo

A ordem chegou por um parente de um funcionário: a escola municipal, onde estudam mais de mil alunos em Santa Cruz, deveria fechar, no máximo, às 20h30. O toque de recolher foi determinado pela milícia que domina a região, após uma semana de tiroteios entre traficantes e policiais no bairro, em meados de junho. Por um mês — até o recesso da rede, que começou na última sexta-feira —, o turno da noite, com aulas para adultos até às 22h, foi encerrado uma hora e meia antes. Não há previsão para reposição do conteúdo perdido, e o temor é que isso volte a ocorrer após o fim das férias.
O episódio entra numa lista, já extensa, de casos envolvendo violência e a escola — não identificada a pedido dos funcionários. A unidade já teve até que passar por obras após consecutivos furtos: quatro portas de salas de aula que davam acesso ao corredor interno — e eram usadas por assaltantes que queriam chegar à sala de informática, cheia de computadores — foram fechadas com cimento.


— É muito difícil trabalhar nessas condições. Em 2013, nossa sala de informática “se transformou” em sala de leitura, depois que todos os computadores foram levados. Agora, não sei até quando vamos ser obrigados a fechar mais cedo por conta dessa ordem. Precisamos nos desdobrar para não prejudicar o aluno — afirma um professor.
A escola entrou em recesso nesta semana. As aulas voltam em 1º de agosto. Professores ainda não sabem se o toque de recolher vai persistir.
Computador não ‘dorme’ mais na escola
Após o furto de todos os computadores que eram usados pelos alunos, a direção da unidade decidiu não arriscar: o computador da área administrativa não passa mais a noite na escola. Todos os dias, ao fechar o colégio, um funcionário leva o aparelho para casa. E traz de volta no dia seguinte.
Um levantamento feito pelo EXTRA com base em dados obtidos via Lei de Acesso à Informação mostra que Santa Cruz é o bairro do Rio com mais casos de furtos em escolas: foram 12 de janeiro de 2016 a março deste ano. A região é palco de constantes confrontos entre o tráfico, que domina as favelas do Rola e de Antares, e milicianos. O Centro aparece em segundo, com 10. Bangu, Campo Grande e Guaratiba têm 8.
Professores roubados
Apesar de bairros da Zona Oeste liderarem o ranking de número de ocorrências de furtos em escolas, a Zona Norte registra mais casos, no total: foram 86 em um ano e três meses, contra 55 na Zona Oeste. Os casos, em sua maioria, acontecem durante a madrugada ou nos períodos de férias, com os colégios vazios. Há duas semanas, no entanto, o crime invadiu uma das escolas da região no horário da entrada dos funcionários.
Por volta das 7h20 do último dia 6, três homens, um deles armado, invadiram o Ciep Oswald de Andrade, em Parque Anchieta, pela garagem. Quatro professores que chegavam para mais um dia de aulas foram rendidos. Os bandidos levaram celulares, documentos e o carro de uma das vítimas. Horas após a fuga, o Ciep sediou a cerimônia de formatura do Programa de Resistência às Drogas (Proerd), um projeto em que policiais militares ministram cursos de prevenção às drogas e à violência para alunos da rede.
No último domingo, o EXTRA, revelou, no primeiro capítulo da série “Educação Roubada”, que uma escola da rede municipal é alvo de bandidos a cada três dias no Rio. De janeiro de 2016 a março deste ano, foram 157 furtos, 19 invasões e um caso de dano.

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