Um levantamento elaborado pelo cientista político Pablo Nunes, coordenador do Centro de Estudos de Segurança e Cidadania, fundado pela Universidade Cândido Mendes, revelou que 85 candidatos nas eleições municipais de 2020 foram assassinados no Brasil até o último dia 20 de novembro. Os dados abrangem políticos que concorreram aos cargos de vereador, prefeitos e vice-prefeitos.
De acordo com o Pablo Nunes, doutor pelo Instituto de Estudos Sociais e Políticos da Uerj (Universidade Estadual do Rio de Janeiro), houve outros 119 registros de agressões contra políticos que registraram candidaturas. O pesquisador também elaborou um mapa que consolida os casos de homicídios, tentativas e outras agressões violentas intencionais contra vereadores e prefeitos.
Os assassinatos ou tentativas são praticados em praticamente todos os estados brasileiros, em cidades pequenas ou grandes centros. Recentemente, o candidato a vereador de Guarulhos, na Grande São Paulo, Ricardo Moura (PL)São Paulo, foi baleado enquanto fazia uma transmissão ao vivo pelo celular.
Em São Vicente, município da Baixada Santista, a candidata a prefeita da cidade Solange Freitas (PSDB) teve o carro atingido por tiros. A blindagem do veículo protegeu a política e equipe que a acompanhava.
Já o candidato à Prefeitura de Armação de Búzios (RJ) Tom Viana (PSL) foi vítima de um ataque a tiros em Cabo Frio, na região dos Lagos. O político, que é policial militar, não foi atingido porque o veículos era blindado. Segundo o depoimento da vítima, dois homens em uma moto emparelharam na estrada e efetuaram os disparos.
Motivações dos crimes
Pablo Nunes considera inviável elucidar os motivos de grande parte dos atentados em razão das deficiências verificadas nas investigações policiais de homicídios e da "alta impunidade nos crimes violentos" no país.
"[Em] muitos desses casos de mortes de políticos, a gente tem as informações que foram colocadas pela imprensa e algumas atualizações que também foram feitas por esses órgãos. Então, é muito difícil definir algumas das motivações", frisou.
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O especialista identificou muitos indícios na dinâmica dos crimes que o levam a suspeitar de casos de execução. "Essa dinâmica de dois homens em uma moto ou dois homens em um carro, que saltam desse veículo e efetuam disparos contra o político."
No entanto, o cientista político Pablo Nunes considera difícil atrelar os crimes aos mandantes ou definir se a motivação partiu de uma rixa local e relacionada à atividade política da vítima ou uma possível ligação com o crime organizado.
"É muito difícil fazer uma linha divisória entre o que é nitidamente uma motivação política ou motivação de crime organizado, porque essas fronteiras estão meio meio apagadas, opacas. Mas, sim, tem alguns casos em que há milícia e questões de tráfico envolvidos", avaliou.
Se a descoberta da motivação dos assassinatos é penosa para as autoridades policiais, a elucidação dos assassinatos também tem índices baixos. Poucos casos chegam a julgamento e os processos abertos podem se arrastar por até cinco anos.
"A gente tem casos, como o de um candidato a vereador em Patrocínio [MG] que foi morto enquanto estava em uma live na internet. Então, toda a dinâmica foi filmada e o autor foi rapidamente reconhecido. De certa forma, é uma investigação que vai ser mais fácil. Nos outros casos, que são a grande maioria, são a dinâmica de execução em que os criminosos rapidamente fogem da cena do crime e muitos deles não deixam rastro", complementou.
Perfil das vítimas
Segundo o estudo publicado pelo Centro de Estudos de Segurança e Cidadania, a maioria das vítimas é composta por homens — salvo poucos casos nos quais as mulheres foram alvo dos assassinos — com idade média de 49 anos. Também não foi possível fazer um recorte racial com a análise dos crimes, um dos pontos pretendidos pela pesquisa.
"Existem dois ou três casos de mulheres que foram mortas. No caso das mulheres, não é uma proporção significativa, porque a gente sabe que as mortes violentas no país se concentram na população masculina. Mas esse numero de 49 anos em média aponta para uma diferença dos homicídos no geral, pois o político, normalmente, tem um perfil mais velho do que a população em geral", explicou Nunes.
Impacto na democracia
Pablo Nunes vê a violência política como uma ferramenta nas disputais eleitorais no país e avalia que uma das suas consequêncas é o enfraquecimento do sistema democrático, pois tira a possibilidade de votar e ser votado que o cidadão possui.
"Quando você, por meio da violência, proíbe a pessoa de se colocar como candidato, você está colocando em xeque e impossibilitando que uma parcela da população tenha um representante dos seus interesses. A própria ideia da democracia é colocada em xeque", finalizou.
A delegada Raquel Kobashi Gallinati Lombardi, presidente do Sindpesp (Sindicato dos Delegados de Polícia do Estado de São Paulo), também vê os atentados contra candidatos com preocupação pelo abalo à democracia.
A policia explica que, ao se deparar com um crime de homicídio ou tentativa de homicídio, a Polícia Civil precisa considerar todas as variáveis ao iniciar a investigação. Apenas ao final das apurações, o delegado poderá indicar no inquérito policial, com base nas provas coletadas, se a motivação do crime foi política.
"De qualquer forma, um crime contra um candidato durante o período eleitoral fere também o processo democrático, porque interfere diretamente no processo de escolha das pessoas que assumirão o poder político e administrativo da cidade, do Estado ou até mesmo do país", enfatizou a delegada Raquel Gallinati Kobashi Lombardi.
R7
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