Cientistas brasileiros constataram que a interferência do homem no habitat natural das araras-azuis, além de colocar a espécie em risco, influenciou uma anomalia genética. Os pesquisadores identificaram mudanças no desenvolvimento da arara-azul que provocaram o aparecimento de espécimes anões, cerca de 70% menores que as outras.
Segundo a bióloga Neiva Guedes, idealizadora e presidente do Instituto Arara Azul, um estudo de longo prazo pela sobrevivência da espécie ocorre há mais de 30 anos no Pantanal e no cerrado. O trabalho acompanhou o desenvolvimento corporal dos filhotes de arara-azul na natureza.
Ao longo desse período, foram observados alguns indivíduos anões, mas só foi possível confirmar que não eram casos isolados quando buscaram comparação em um banco de dados dos últimos 30 anos.
"Essa observação de indivíduo anão foi desde o começo, dos primeiros ninhos no início do projeto. Achava interessante, e particularmente lindinhos, pois pareciam miniaturas de araras. Porém, não era esse o objetivo do nosso trabalho. O objetivo é verificar e encontrar um método que explicasse o desenvolvimento desta espécie que é tão emblemática e tem a reprodução bem baixa na natureza", explicou.
O banco de dados do instituto aponta mais de 800 filhotes anões. No entanto, cerca de 400 participaram da análise. Isso porque nem todos os filhotes monitorados desde a 1ª semana de vida sobrevivem. "Então, só trabalhamos com uma amostra dos filhotes que sobreviveram e voaram", contou.
A mão do homem
A cientista esclarece a Ecoa que ainda não tem uma explicação conclusiva para o achado, uma vez que as araras-azuis anãs representaram 8% da amostra total, mas segue a linha de "consequência pela interferência do homem no habitat natural da espécie" por perceber que houve um crescimento de espécimes anões após desmatamentos e incêndios.
"Estamos prosseguindo com os estudos para confirmar se os impactos dos incêndios e mudanças climáticas afetam o desenvolvimento de filhotes de araras. Onde a escassez de alimentos pós esses impactos geram um aumento de araras-azuis anãs. Mas, só no futuro, com as análises de campo e de laboratório é que poderemos confirmar isso. Agora, é fato, que esses indivíduos, embora menores, conseguem sobreviver e voar sem problemas", disse.
Nova ameaçada de extinção
As araras-azuis estavam ameaçadas desde o fim da década de 1980. Com os estudos do instituto, aponta Neiva, elas conseguiram sair da lista de espécies brasileiras ameaçadas de extinção em dezembro de 2014. No entanto, com os grandes incêndios no Pantanal em 2019 a 2021, a espécie pode voltar à lista, uma vez que esses impactos afetaram consideravelmente a sobrevivência delas, podendo levá-las à extinção em 10 ou 20 anos.
Mas o que seria preciso ser feito para protegê-las? Em primeiro lugar, detalha a bióloga, é imprescindível a continuação dos estudos, monitoramento e manejo. Para a comunidade cientista, explica ela, só a pesquisa pode dar respostas e propor medidas de conservação.
Além disso, continua, a educação ambiental é um caminho inevitável, com o envolvimento da comunidade em geral, não só no local de ocorrência da espécie, mas de uma forma geral, no objetivo de evitar o tráfico, a descaracterização do ambiente e a coleta de penas.
"Soma-se a isso legislação mais adequada e fiscalização mais efetiva, pois infelizmente, depois que saiu da lista de espécies brasileiras ameaçadas de extinção, o tráfico voltou, com a coleta e transporte de ovos. E o impacto disso na população é grande, pois a reprodução das araras azuis é baixa", destacou.
Toda a parte de monitoramento e manejo, busca do envolvimento da comunidade e de subsídios para políticas públicas fazem parte do trabalho dos pesquisadores. Cada ninho, explica Neiva Guedes, é monitorado e acompanhado desde o ovo até o voo do filhote.
"Fomos monitorar três ninhos na semana passada. Levamos mais de uma hora para chegar lá e ver que o filhote tinha sido predado. É uma sensação de impotência horrível. Os pais ficam voando e vocalizando em volta", conta.
A equipe colocou cinta metálica em volta de todos os ninhos ativos (com ovos ou filhotes) para evitar predação, mesmo assim, na natureza, tudo é possível. "Mesmo com toda a prevenção, ocorreu predação. Tinha dois filhotes inicialmente, mas um morreu logo depois de nascido e o outro filhote que sobreviveu, o primeiro, maior, estava com quase 30 dias quando foi predado."
A bióloga alerta que projetos de longo prazo são difíceis de manter porque não têm novidades todos os dias nem achados todos os anos, mas são importantes por conseguirem respostas fundamentais para o entendimento da espécie e suas relações.
"Dependem de recursos e muita persistência. Então, se você quiser nos ajudar, adote um ninho, um filhote etc. No nosso site, verá como isso é fundamental para continuidade dos trabalhos. E somos muito gratos a todas as pessoas e empresas que nos acompanham por longo prazo, como a Fundação Toyota do Brasil, Toyota, Caiman e mais recentemente o Zoo de Zurich e Loro Parque", ressaltou.
Para ajudar o Instituto Arara Azul, basta acessar o site da instituição e se cadastrar. Você pode doar qualquer valor ou adotar um ninho ou filhote.
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