Quem dirigir embriagado terá punições mais severas a partir desta quinta-feira, quando começa a valer a lei federal nº 13.546, de 2017, que altera a lei nº 9.503, de 1997, do Código de Trânsito Brasileiro (CTB) e prevê uma pena maior de prisão. Hoje quem causar morte no trânsito e estiver alcoolizado pode pegar de dois a quatro anos, mas de acordo com a nova lei ela passa a ser de cinco a oito anos.
De acordo com o Departamento Nacional de Trânsito (Denatran), mesmo com a mudança, a prisão ainda poderá ser substituída por prestação de serviços. A possibilidade vale para os casos de crime culposo (quando não há intenção de matar). Isso ocorre porque o Código Penal (Art. 44, inciso I) prevê a substituição quando a sentença não é superior a quatro anos, ou quando o crime é culposo — seja qual for a pena aplicada.
Redator da lei federal que vai entrar em vigor e presidente da Comissão de Direito Viário da OAB-SP, o advogado Maurício Januzzi afirmou ao GLOBO que a ideia de aumentar a pena era, justamente, evitar a dúvida jurídica entre o homicídio ser doloso (quando há intenção de matar) e culposo (quando não há):
— Isso gera discussões que vão até os tribunais superiores. Entendeu-se que (os homicídios por embriaguez) deveriam ser culposos, mas com pena aumentada, porque parte pode ser cumprida em regime semiaberto. É para dar a informação de que matar no trânsito dá cadeia.
Na prática, segundo ele, o homicídio por embriaguez no volante continua a ser considerado culposo, o que leva à possibilidade de o encarceramento ser revertido em prestação de serviços. Mas a pena mínima de cinco anos, diz Januzzi, leva o juiz ao entendimento de que a pessoa pode, sim, ser presa:
— Cabe ao juiz determinar se a pessoa vai ser presa ou não. Se for o juiz legalista, vai determinar a prisão no semiaberto. Isso porque quando a pessoa é condenada de dois a quatro anos, o magistrado pode dar suspensão condicional do processo. Com cinco anos ou mais não pode.
Januzzi afirma que é preciso ler a pena de acordo com o Código Penal, que determina a prisão para casos acima de quatro anos. Ele disse não acreditar que a possibilidade de prender ou não gere insegurança jurídica no futuro. E defendeu a criação de uma vara especializada em julgar crimes de trânsito, como forma de consolidar um único entendimento.
— Acredito que não (vá gerar insegurança jurídica). Acho que outra medida importante, que já tem inclusive no Paraná, é uma vara só para crimes de trânsito, o que pode dar uma interpretação mais restritiva para a lei, como essa que queremos — disse ele.
No entanto, Januzzi admitiu que somente o endurecimento penal não é solução para os homicídios no trânsito. Disse ainda que é necessário fazer uma fiscalização em tempo integral, com testes de bafômetro.
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— O aumento da pena não vai, por si só, resolver o problema. Tem que ser acompanhado de política pública de fiscalização maior. Não só durante a noite, mas também durante todo o dia, com disponibilização de carros de bafômetro — disse ele.
A assessoria da Operação Lei Seca no estado do Rio afirmou ao GLOBO que, desde 19 de março de 2009, quando a ação começou, o percentual de motoristas abordados embriagados nas blitzes era de 7,9%. A média caiu para 4,25% em 2017.
Em nove anos, a operação fez 20.491 ações de fiscalização no Rio. O total de motoristas abordados foi de 2.835.188, sendo 184.378 embriagados — média de 6,5%. Em 2017, foram 343.383 motoristas, 14.616 alcoolizados. Já neste ano, até agora foram abordadas 98.194 pessoas, sendo 3.845 embriagadas (3,91%).
Em nota, a Lei Seca acrescentou que a "comparação entre o número de motoristas abordados e os flagrados com sinais de embriaguez reduziu 45% em nove anos".
'IDEAL' É RETIRAR HABILITAÇÃO, DIZ ESPECIALISTA
De acordo com o professor de Direito Penal Claudio Pereira, da PUC-SP, o "ideal" seria retirar definitivamente a carteira de habilitação do motorista que cometesse um homicídio no trânsito por embriaguez.
— Hoje a pessoa tem a perda da habilitação por um período. Mas pode retomar essa habilitação por um certo tempo. Esse é o grande problema. Depois voltam a dirigir. Acredito que o ideal seria perder definitivamente (a carteira) ou por um período do dobro, ou ainda superior ao da pena, no caso de condenação — afirmou ele.
Segundo Pereira, o endurecimento não pode ser visto como solução definitiva para os homicídios no trânsito. Em vez do Direito Penal, o professor propõe medidas administrativas.
— Essa é medida legislativa para responder ao aumento dos homicídios no trânsito, mas não acredito que seja através do Direito Penal que vamos conseguir resultados (definitivos). Em vez de ficar pensando em aumentar pena, temos que pensar se não temos medidas administrativas melhores — disse ele.
Além da perda da carteira de habilitação, Claudio Pereira também defende outras medidas que, de acordo com ele, seriam mais eficazes. Segundo ele, as campanhas de conscientização e a restrição de bebidas em determinados locais seriam boas maneiras de combater o crime no volante.
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— Evidentemente não podemos deixar de lado a responsabilização nesses casos gravíssimos e irreparáveis (de homicídio). Todavia, esse não deve ser o único meio de solução do problema. Também deveriam continuar as campanhas de conscientização. E, hoje, ainda temos proibições totalmente flexibilizadas sobre venda de bebidas, inclusive em locais com estradas. Mudar essas coisas teriam mais eficácia que medidas penais — explicou.
PUNIÇÃO PARA OUTRAS SUBSTÂNCIAS
De acordo com o Departamento Nacional de Trânsito (Denatran), a punição também vai valer para quem dirigir sob efeito de "qualquer outra substância psicoativa que determine dependência".
Para fixar a pena-base de quem cometer o crime, o juiz deve examinar: culpabilidade, antecedentes, conduta social, personalidade do agente, motivos do crime, circunstâncias do crime, consequências do crime, comportamento da vítima.
G1
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