Por conta da tarifa de 50% imposta pelo presidente Donald Trump às exportações brasileiras, a fabricante de armas Taurus decidiu transferir sua principal linha de montagem do Rio Grande do Sul para os Estados Unidos. Com o anúncio, as ações da empresa encerraram a sexta-feira em queda de 7,07%, aos R$ 4,60. A companhia perdeu R$ 33 milhões em valor de mercado, alcançando R$ 705 milhões.
O mercado americano responde por cerca de 90% das vendas da Taurus, com foco no mercado civil, via distribuidores locais. Em comunicado, o CEO global da fabricante de armas, Salesio Nuhs, afirmou que, desde que as discussões sobre o tarifaço começaram, a empresa vem tomando providências para minimizar os efeitos do tarifaço.
Ele cita que, desde abril, a Taurus começou a reforçar preventivamente o estoque de produtos acabados nos Estados Unidos. Além disso, para evitar a taxação de 50%, a companhia também antecipou exportações de algumas peças e partes de armas para os EUA, em especial carregadores.
"Temos cerca de 90 dias de estoque, o que dará autonomia de alguns meses com produtos internalizados antes da nova tarifa", afirmou Nuhs no texto.
Agora, a companhia decidiu iniciar o processo de transferência das linhas de montagem de armas da família G — de pistolas de uso civil, e principal linha de produtos da Taurus — da fábrica no Rio Grande do Sul para os Estados Unidos.
Segundo a empresa, a partir de setembro serão montadas diariamente no país cerca de 900 armas, de um total de 2,1 mil produzidas no Brasil que hoje são destinadas ao país americano.
"Todas essas importantes medidas, assim como possíveis outras, manterão a empresa geradora de resultado, EBITDA e de caixa", defendeu o CEO.
Na fábrica na cidade gaúcha de São Leopoldo, onde são fabricadas armas e carregadores, a Taurus emprega 2,2 mil pessoas. Não há informações se a decisão de transferir a linha de montagem para os EUA resultará em demissões.
A companhia ainda tem unidades em Haryana, na Índia, e em Bainbridge, no estado americano da Geórgia. Lá, são fabricadas apenas 25% das armas da Taurus, especificamente pistolas TX22, de uso recreativo e esportivo, e revólveres Heritage, marca americana incorporada pela Taurus há 32 anos.
Chrystian Oliveira, analista da Levante Corp, avalia que a reação do mercado ao anúncio da Taurus reflete a previsão de que, apesar de já contar com uma unidade fabril nos EUA, a transferência da linha de montagem para o país irá exigir da companhia um investimento adicional.
Na visão dele, a estratégia adotada pela empresa "prepara o terreno" para uma possível transferência da linha de produção em si.
— Levar a linha de montagem é muito mais simples e barato e dá tempo para que se analise a viabilidade de, depois, instalar a produção completa, que é um processo muito mais robusto, de maior complexidade. Exige uma infraestrutura fabril robusta — afirma.
Oliveira ainda destaca que terminar de montar as armas nos EUA não torna a Taurus isenta das tarifas, mas suaviza o impacto das taxas:
— Os componentes ainda serão taxados. Mas, em vez de taxar toda a arma pronta, a tarifa vai incidir apenas sobre o kit desmontado. Com mão de obra local, a arma ganha valor agregado "made in USA", o que suaviza o impacto tarifário. Vai haver impacto de margem, mas será menor.
O movimento da Taurus acontece depois de a Embraer, livre da tarifa adicional de 40% anunciada por Trump, acenar para investimentos de US$ 500 milhões em cinco anos nos EUA. Os recursos seriam aplicados para montar o KC-390 no país, caso o avião seja escolhido pela Força Aérea americana.
Para Welber Barral, ex-secretário de Comércio Exterior e sócio da consultoria BMJ, o movimento das duas companhias não deve se repetir em outros setores econômicos que exportam para os EUA.
— Nem sempre é tão simples. Não é possível, por exemplo, produzir café ou manga nos EUA. Também é complicado para setores como os que dependem de muita mão de obra, ou mão de obra qualificada, como a indústria têxtil e de calçados. No caso de alumínio ou aço, a ausência de matéria-prima inviabiliza a produção local, porque o custo logístico seria gigante — exemplifica.
Ele completa:
— Os setores que conseguem migrar operações são aqueles em que é possível transferir uma linha de produção com menor necessidade de infraestrutura e em que já exista um mercado consumidor garantido. Peças específicas para a indústria ou alguns bens de consumo de baixa complexidade podem justificar a mudança. Ainda assim, é muito mais provável que países como México ou China vejam empresas sendo transferidas do que o Brasil.
O comunicado assinado pelo CEO da Taurus também destaca que a Taurus continua se articulando com autoridades do governo brasileiro, "evidenciando a importância estratégica da empresa e mostrando que uma alta taxação, seja na arma e/ou na peça, dificulta a operação da companhia para exportar para os Estados Unidos".
O texto cita conversas com autoridades, além dos vice-presidente Geraldo Alckmin e do ministro Fernando Haddad, negociações com o governo do Rio Grande do Sul para a liberação de créditos de ICMS, "de modo a fortalecer o fluxo de caixa da companhia".
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