Após 14 anos de Corinthians, goleiro dirige Uber enquanto aguarda chance

Goleiro está com 21 anos atualmente.

BATE-BOLA com RAVI
Ex-goleiro do Corinthians, ao L!
Para começar, queria que você contasse um pouco da sua trajetória como goleiro...
Eu comecei a jogar futebol com quatro anos de idade, no Nacional de Jundiaí. Com sete eu joguei uma competição contra o Corinthians, eles gostaram de mim, conversaram comigo e meu pai e fui para o Corinthians em 2001. Fiquei um ano no salão e no ano seguinte começou o primeiro no campo, eu era um dos mais novos da categoria. Aó fui subindo de categoria e completei 14 anos de Corinthians. Comecei a jogar na linha, não era goleiro, mas não tinha muita habilidade, então tentei no gol e deu certo. Meu pai também foi goleiro, meio que já estava no sangue. Ele chegou a jogar em alguns clubes de base e no futebol do Piauí, mas com 23 anos ele encerrou e focou em família, outras coisas profissionais. Na época que eu comecei, ele era o treinador do time, então mesmo não jogando mais ficou no meio do futebol. Mas foi só pouco tempo.
E qual a importância do Corinthians nesse processo todo?
Tudo que eu tenho e sou hoje agradeço principalmente ao Corinthians. Lá que eu fui realmente conhecer e viver o futebol, aprender tudo. Da primeira vez que eu treinei lá comecei a aprender as coisas. Dos 7 aos 21 anos, aprendi tudo, da parte técnica de ser goleiro à parte como pessoa, eles me auxiliaram a me tornar um homem. Parte de educação também. Mas foi muita experiência no meio do futebol, cheguei a treinar com o Ronaldo na minha época de profisional. Foi um privilégio enorme. Tudo que eu conheço de futebol hoje, e a experiência que tenho, agradeço muito ao Corinthians, que me tornou o que sou hoje.
A Copa São Paulo de 2012 foi seu auge?
Aqueles dois anos, entre 2011 e 2012 foram os meus melhores anos. Antes da Copa São Paulo eu havia sido campeão mundial sub-17 na Espanha, fomos campeões em cima do Barcelona e eu fui o melhor goleiro do Mundial. Em seguida fomos campeões de um torneio no Canadá, e logo depois estive na Copa São Paulo. Aí eu estava no banco até a final e na final o Matheus machucou, eu tive a oportunidade de entrar. Ali foi o principal, o de mais importância para mim. Não só por ser final, mas Pacaembu lotado, jogo empatado quando eu entrei, qualquer falha poderia ser fatal. O jogo estava encaminhando para os pênaltis até que aos 43 saiu o nosso segundo gol e fechamos, não podia passar nada. Eu, de fora, estava bem mais nervoso do que quando entrei. Fora você quer ajudar, mas não pode fazer nada, e do campo você vive o clima, parece que esquece tudo e foca só no jogo. Acredito que entrei bem concentrado e a pressão não me atrapalhou.
Você também jogou emprestado ao Flamengo de Guarulhos. Como foi?
Fui em 2013 para jogar a Série A3 e fiquei em 2014 também, emprestado pelo Corinthians. Foi bom como experiência, primeiros campeonatos profissionais que eu tive. Aquele clima de disputar campeonatos foi inédito, uma experiência que eu não tinha tido. O Corinthians trata o Flamengo de Guarulhos como um Corinthians mesmo, até material de treino, só muda a camisa, para aproveitar jogadores não utilizados e tal. Em 2014 voltei para o sub-20 do Corinthians, mas fui reemprestado ao Flamengo para jogar a A3 de 2015. Mas aí devido a coisas dos bastidores eu não disputei o campeonato.
O que aconteceu?
Até novembro estavam contando comigo para fazer parte do elenco da A3. Em dezembro eu estava machucado e perguntaram da minha lesão, porque contavam. Aí depois contrataram um goleiro mais velho, que veio do Rio de Janeiro para ser titular. Mas aí eram ele, eu e mais um 95. De última hora contrataram um goleiro do XV de Piracicaba e optaram por ele. Meu contrato já estava para acabar e preferiram não renovar, então fiquei só treinando. 
E de repente os dois contratos, com Flamengo e Corinthians, terminaram?
Acabou um pouco antes do fim da Série A3 de 2015 e eu comecei a ver minhas coisas. Meu contrato com o Corinthians acabou em abril de 2015 e conversamos para ver o que seria feito. Fiquei um tempo no Ituano, mas eles passaram de fase na Copa do Brasil e não renovaram o elenco, como era esperado. A intenção era que eu ficasse lá, mas como os goleiros renovaram não teve como. Depois não fui mais para nenhum clube. Tive algumas propostas, mas nada valeu a pena realmente. Hoje faço treinamento específico de goleiro no Muralha, academia de goleiros do Victor, do Atlético-MG. Treino de três a quatro vezes por semana, para manter a forma até aparecer alguma coisa. Junto com isso estou fazendo academia para manter o máximo que puder a forma física.
Teve alguma proposta nesse quase um ano parado?
Esse ano apareceu Série A1, A2 e A3. Paulista de Jundiaí fez uma parceria com um grupo de empresários de fora, era uma possibilidade que eu tinha no clube da minha cidade e não deu certo. Apareceu Capivariano também, conversei, mas parece que eles preferiram o goleiro do Santos. Vi no Ceará também, mas preferiram outro goleiro da minha idade, então não deu certo. Agora a intenção é ir para fora. Estados Unidos é um mercado que está crescendo bastante, Portugal é uma porta boa também, mas estou vendo agora é pros lados da Escandinávia, Finlândia. Dei entrada no processo do passaporte europeu e está mais ou menos nessa situação.
Quando espera resolver?
Espero que o mais rápido possível. Não esperava que fosse demorar tanto tempo assim. Na verdade, achei que as coisas fossem ser rápidas depois que eu saísse do Corinthians. Achei que no início do ano teria uma coisa certa, mas não aconteceu ainda. Agora quero em março ainda ter algo certo. É torcer e rezar para demorar o mínimo de tempo possível.
Como foram seus treinos no profissional do Corinthians?
Fiz meu primeiro treino com 14 ou 15 anos, aí depois disso sempre ficava um tempo, uma semana, um mês. Fiz bastante treino lá. Em 2012 fiz intertemporada em Extrema, ia ter jogo com o Flamengo, aí fiquei concentrado com o grupo em uma época que eu treinava bastante no profissional. Treinei com o Ronaldo, tive esse privilégio. Foi uma coisa que me marcou. Não tirei foto, por mais que eu tive vontade levei mais para o lado profissional. Sempre encarei assim. Queria ter tirado foto, mas não tirei.
Você conviveu bastante com o Matheus Vidotto na base do Corinthians. Como vê essas chances que ele teve em 2016?
A base inteira joguei com ele, conheço bem. Pela história de superação que ele tem, chegar onde chegou é uma conquista enorme. Ele é um ano mais velho que eu. Quando ele estava no sub-15 eu era do sub-14, sempre uma categoria a mais. Lembro da época em que ele precisou se afastar, quando pensavam que ele não voltaria a jogar, mas conseguiu dar a volta por cima. Na época da Copa São Paulo ele foi bem, e logo em seguida foi efetivado no profissional. Ele está se dedicando e se teve as oportunidades que teve foi por merecimento. Com certeza ele está muito contente, porque o sonho de qualquer um da base é chegar no profissional. Ele conseguir isso pelo Corinthians é sensacional.
Tem contato com ele ou alguém até hoje?
Com o Matheus não muito, só com o pessoal da minha categoria. PC, do Strikers, Ayrton, que está no Tigres. Esses são os que converso mais, até por serem meus parceiros de quarto no alojamento.
É verdade que além do futebol você se dedicou aos estudos nos últimos anos?
Me formei em marketing há um ano e meio. Aproveitei que o clube tem uma parceria com o João XXIII, e quase todos os alojados estudavam lá. Fui para lá no segundo ano do Ensino Médio e me formei lá. Depois eu só treinava, e queria fazer mais alguma coisa no meu tempo livre. Vi um assunto que me interessava e comecei a fazer seis meses depois de sair do colegial. Aí foram dois anos, e tinha algumas facilidades quando precisava viajar para campeonato, treinos. O clube me ajudou a me formar na faculdade.
Por que quis fazer faculdade?
A gente sempre precisa estar com a cabeça aberta para conhecer novas coisas, receber novas informações. Tudo que eu posso aprender eu vou querer saber e conhecer. Achei que era um momento em que eu tinha oportunidade e podia aproveitar. Naquele momento podia não ser útil, mas um dia poderia ser. Como já é. Então aproveitei o tempo livre à noite e fiz. Comecei o primeiro semestre para ver se eu chegaria no segundo, aí entrei no segundo para ver se eu conseguiria ir até o terceiro, aí começou o terceiro e não dava mais para largar. O clube sempre me ajudou, a galera dava uma força quando perdia matéria. Aprendi muita coisa, fora o futebol, através do Corinthians.
E foi bem? Conseguiu boas notas?
Sofri bastante para fazer trabalho, desenvolver várias coisas. Eu sempre me interessei por marketing, mas lá dentro fui conhecendo mais. Teve provas que tirei a melhor nota, às vezes me sentia bem inteligente, porque tinha a vida corrida de me preocupar mais com futebol, mas me dei bem, tirei nota boa, fiz trabalhos. Foi importante, porque sempre pensei em abrir um negócio, e um tempo depois que acabou meu contrato com o Corinthians e voltei para Jundiaí e abri minha empresa usando muita coisa que aprendi e via na faculdade.
Do que é essa empresa que você abriu?
Abri um negócio de lavagem ecológica em Jundiaí, mas hoje está parado. Precisava de tempo para me dedicar, e preciso de alguém de confiança para tomar conta, porque a qualquer momento o telefone pode tocar e eu não sei para onde vou. Fazer por fazer não dá.
E como surgiu o Uber na sua vida?
O tempo foi passando e a gente sem clube, sem receber. Você acaba precisando de dinheiro, não tem jeito, todo mundo precisa. Eu conheci o Uber no fim do ano passado e vi que dava para ser motorista, mas de início tinha uma burocracia, um cadastro gigante, aí deixei meio de lado. Mas passou um tempo, a situação foi apertando, e eu dei uma olhada de novo. Aí fiz tudo e acertou isso. Vai fazer um mês que estou, meio que no começo. Estou aproveitando meu tempo livre, que não estou treinando e nem na academia, como uma forma de ganhar dinheiro. Por enquanto está dando certo, mas é temporário para eu me manter até aparecer algo.
E como tem sido sua rotina?
Treino de segunda, quarta e sexta de manhã, vou para a academia e depois venho para São Paulo, fico até à noite. Nos dias em que não treino já venho mais cedo, e tudo depende dos meus compromissos. O bom do Uber é não estar preso com horário, posso encaixar com meus compromissos. Está sendo bom por isso.
Está tendo retorno financeiro?
Está tendo. Eu preferia estar tendo jogando, sem dúvida, mas há uma facilidade de encaixar horários e isso faz valer a pena. Eu também gosto de carro, gosto de dirigir, acaba que para mim vou fazendo, e retorna um dinheiro que está sendo útil para mim. Não é nada demais, mas me mantenho até tocar o telefone e mudar tudo.
Como conheceu o Uber?
O marketing me fez abrir a cabeça para muita coisa, e o Uber foi uma coisa que revolucionou aqui no Brasil e me chamou atenção nesse lance de transporte. Por toda a repercussão que deu, confusão com taxista, foi uma divulgação. Muita gente se indignou com taxista e optou pelo Uber. Quem já conhecia passou a usar mais, e quem não conhecia gostou. E facilitou para muita gente, não só pelo lado econômico, porque a pessoa consegue economizar mais dinheiro, mas também pela qualidade e conforto. O brasileiro gostou e está usando bastante. É um tabu que está sendo quebrado. Muita gente não conhece e tem dúvidas, mas quando começa a usar muda de ideia. Nesse ramo de táxi só existiam eles, e o Uber tomou conta de uma fatia. Mas daqui a pouco vai chegar algo melhor que o Uber e assim vai indo. Com esse avanço da tecnologia muita coisa que tinha antes passa a não ter mais. Você vê muitos jornais fechando, gravadoras de discos, locadoras de vídeo. As coisas vão caminhando, e a tendência é a vida ficar mais prática.
O que o Uber do Ravi tem de diferente dos outros?
Eu tenho como base água e bala, mas sempre penso em um diferencial, porque o marketing que eu estudei me abriu a cabeça. Eu tenho revistas para quem quiser ler, ponho um amendoim, porque às vezes não almoçou, está com fome, tenho encosto para cabeça, teve dia em que coloquei fruta, tem carregador de celular para quem precisa. Serviço completo, cinco estrelas. O negócio é tratar a pessoa da melhor forma possível. Cada motorista é dono do seu próprio negócio dentro do Uber, e a gente depende disso, de atender bem para ter boa avaliação e continuar operando. Tudo que eu for fazer eu vou tentar fazer da melhor forma possível, e aprendi isso dentro do Corinthians. Lá havia uma pressão grande para sempre ganhar, e isso criou meu perfeccionismo, de sempre querer o melhor. Levo isso para minha vida, e tudo que eu fizer vou tentar fazer da melhor forma possível.
Agora, a esperança de conseguir se ajeitar logo no futebol...
Até um tempo atrás não pensava dessa forma, mas hoje consigo: tudo tem um motivo. se até hoje não acertei alguma coisa é poque tem algo melhor por vir. Com o tempo que passa a gente entende porque certas coisas acontecem. Hoje meu pensamento é de entender o que está acontecendo e viver, mas em breve quero voltar a fazer o que sempre gostei e quis. Infelizmente não dá para saber quando, mas espero que logo logo a gente volte à ativa, eu ganhe meu espaço de novo e faça minha carreira subir de novo, construir a história que eu sempre sonhei. Preciso estar preparado, treinando, para quando tiver a oportunidade eu conseguir aproveitar bem e não parar mais.
portal l

Nenhum comentário:

Postar um comentário