Trabalhador mantido em situação análoga à escravidão por 8 anos processa ex-patrão em Salvador

 




Um trabalhador de 51 anos processou o ex-patrão por mantê-lo em situação análoga à escravidão durante oito anos, em Salvador. A vítima fazia serviços em uma escola particular e era abrigada em um pequeno cômodo improvisado no fundo da instituição, que fechou no início da pandemia.

Além de não receber o que tinha direito pelos anos trabalhados, o trabalhador também ficou sem água e energia, porque o ex-patrão suspendeu o fornecimento. A reportagem não informará o nome da vítima a pedido das entidades de proteção a pessoas resgatadas do trabalho análogo à escravidão.

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O trabalhador conta que o patrão, que não teve identidade divulgada pelos órgãos, sempre prometeu assinar a carteira de trabalho dele, mas nunca o fez.


“Quando eu cheguei aqui, esse barraco que eu moro era de lixo até o teto. Para eu ver a água, eu tinha que capinar o terreno. Aí eu capinava, porque eu não podia ficar sem água”.
O trabalhador também foi vítima de intolerância religiosa e homofobia do ex-patrão. O suspeito nega todas as acusações.

“Eu não podia entrar na escola, porque ele dizia que os pais não gostavam de gay, então eu não podia entrar na escola, tinha que ficar em volta para não ser visto. Mas o pessoal me via, todo mundo me conhece. As festas da escola, as palhas de coqueiro, as desarrumações de festa, era eu quem fazia”.

Sem saber ler e escrevendo apenas o próprio nome, a vítima não tem conseguido oportunidades dignas de emprego. Hoje, ele cata e vende folhas de bananeiras para baianas de acarajé. No entanto, a principal fonte de sobrevivência dele são as doações de vizinhos.

O trabalhador também busca, em meio ao lixo, materiais que podem ser reaproveitados. Em uma dessas andanças, há quatro meses ele encontrou uma imagem de Santa Dulce dos Pobres e a levou para casa.

“Ela já é uma santa e santa não fica na rua. Então eu peguei e trouxe para mim. É uma maneira da gente se proteger. Eu, na verdade, nunca tinha sido ouvido por ninguém. E hoje eu estou feliz (sendo ouvido), porque ninguém nunca me ouviu”.

Depois que encontrou a imagem da primeira santa brasileira, o trabalhador conheceu a namorada de um vizinho, que o encorajou a buscar por justiça. A partir desse incentivo, ele procurou o Ministério Público do Trabalho.

O MPT fez a fiscalização das condições da vítima e confirmou a exploração análoga à escravidão – um crime com pena de até 8 anos de reclusão, como explica a auditora fiscal Liane Durão.

“Esse trabalhador estava sem condições mínimas de dignidade. Estava sem água potável para beber, para tomar banho, para preparar os alimentos. Estava sem condições sanitárias adequadas para fazer suas necessidades, sem ventilação adequada. Era um ambiente totalmente inapropriado para uma pessoa viver”.

A auditora fiscal do órgão também detalhou outras características do crime.

“Pode estar o trabalho forçado, que é aquele em que o trabalhador não se ofereceu ou não deseja permanecer. Pode estar também a jornada exaustiva de trabalho, pode estar presente uma restrição de liberdade, coação de qualquer tipo, agressões físicas, agressões morais. Tudo isso pode caracterizar o trabalho análogo à escravidão”.

O órgão entrou com uma ação cautelar pedindo bloqueio do patrimônio do ex-patrão até R$ 400 mil, a liberação do seguro desemprego e uma pensão mensal de R$ 540 enquanto durar processo. A juíza Luciene de Quadros Veiga determinou que água e luz sejam religadas, e o ex-patrão foi proibido de vender imóvel. (G1)

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